Imortal?

Já passam das quatro da tarde, o sol bate na janela do lado direito do carro e no rádio, legião está tocando. Descubro, graças ao Renato, que sereníssima era como a cidade de Veneza era conhecida. Renato não está mais aqui, assim como diversos outros gênios, poderia ficar remoendo e sofrendo, mas ao invés disso decido acreditar que ele continua ali, imortal, afinal isso é imortalidade. Imortalidade não é nunca morrer, é ser lembrado.
Olho pela janela, por ela vejo uma cidade, o que será que vai durar mais? A cidade ou a memória de Renato? Cidades com prédios, casas, livrarias, cafés, praças, pessoas conversando, vivendo e morrendo.
Reflito por alguns minutos e percebo que cidade nenhuma escreverá "Monte Castelo" ou "Será" ou ainda "Faroeste Cabloco", nenhuma cidade influenciará uma geração, e as seguintes, da mesma maneira que Renato fez. 

Mas apesar de tudo isso, a cidade pode durar mais, os prédios podem ficar maiores, as praças podem abrigar ainda mais conversas, nas quais nenhum Renato Russo será citado, a cidade pode ser lembrada por mais tempo, por seus habitantes. Ela pode até se tornar imortal. 

Como uma cidade pode marcar mais do que um ser humano? Ainda mais um ser humano como o Renato? 

A cidade não está vazia, nela existem pessoas. Pessoas que mesmo que se sentem nas praças para falar de qualquer coisa, menos de um cantor chamado Renato, ainda assim são pessoas, com a capacidade de se tornarem seres humanos tão brilhantes quanto ele, e assim conseguirem sua pequena imortalidade. Talvez não como Renato, porque a riqueza dele, assim como ele cantou, ninguém percebeu, mas ela continua ali, mesmo que ninguém perceba. 

Sua delicadeza nunca poderá ser reproduzida, por ninguém. Nem mesmo por aquele com a capacidade de ser tão brilhante quanto ele. 

Fico em silêncio. E penso. Chego a conclusão que pensar não seja a solução, afinal não sou imortal. Aumento o som por fim e canto Legião a plenos pulmões. 

E não penso.